
El Shaddai: Ascension of the Metatron é inspirado em textos apócrifos da tradição judaico-cristã, especialmente no Livro de Enoque. A história reinterpreta antigos mitos bíblicos sob uma ótica moderna e poética, transformando-os em uma narrativa sobre fé, redenção e rebelião. O protagonista é Enoch, um humano escolhido por Deus para capturar anjos caídos que abandonaram o Céu e passaram a viver entre os homens, corrompendo o mundo com seus ensinamentos proibidos. Essa missão sagrada serve como pano de fundo para uma jornada de autodescoberta espiritual e existencial.
Desde o início, o jogo se diferencia pela forma como apresenta sua história. A narrativa é narrada por Lúcifer — aqui chamado de Lucifel — que atua como mensageiro e guia de Enoch. Ao contrário das representações tradicionais, Lucifel é retratado como um ser enigmático e carismático, vestido com um terno moderno e falando com Deus através de um celular. Essa mistura de elementos contemporâneos e mitológicos cria uma atmosfera surreal e cativante, quebrando convenções e aproximando o jogador de uma visão quase metafísica da realidade.
O enredo se desenrola como uma parábola interativa. Os sete anjos caídos, cada um representando um aspecto da corrupção humana — orgulho, luxúria, ganância e assim por diante — construíram torres monumentais para se esconder da ira divina. Enoch deve escalar cada uma delas, enfrentando inimigos e ilusões até restaurar o equilíbrio entre Céu e Terra. Essa estrutura de “sete torres” funciona como metáfora da ascensão espiritual do protagonista, onde cada desafio representa uma purificação da alma.
A narrativa é propositalmente ambígua, permitindo múltiplas interpretações. O jogo não busca explicar cada símbolo, mas sim convidar o jogador à contemplação. O uso de linguagem religiosa é mais filosófico do que dogmático: El Shaddai fala sobre fé sem pregar, sobre pecado sem julgar. É uma obra que confia na inteligência e na sensibilidade do jogador, algo raro em uma indústria acostumada a respostas claras e tramas lineares.

Visualmente, El Shaddai: Ascension of the Metatron é uma obra-prima. Cada cenário é uma pintura viva em movimento, com estilos artísticos que mudam constantemente conforme o progresso da história. Há fases que parecem aquarelas, outras que lembram esculturas de luz e algumas que se assemelham a instalações artísticas modernas. A ausência de interface de usuário na maior parte do tempo reforça a imersão, fazendo o jogador se sentir dentro de uma galeria interativa de arte espiritual.
A transição entre os diferentes estilos visuais é feita de forma orgânica e surpreendente. Em um momento, o jogador atravessa um deserto abstrato de linhas douradas; no outro, se vê em uma metrópole futurista com arquitetura de vidro e neons. Essa constante mutação visual reflete o estado emocional e espiritual de Enoch, simbolizando o conflito entre o divino e o terreno, o sagrado e o profano.
A jogabilidade combina combate, plataforma e exploração em um formato minimalista e elegante. O sistema de luta é baseado em ritmo e timing, com apenas três tipos de ataques — normal, forte e especial —, mas uma profundidade que se revela no domínio do fluxo e na sincronia com os movimentos inimigos. O combate é mais sobre expressão do que sobre brutalidade: há uma fluidez quase dançante nos golpes de Enoch, que luta com uma leveza angelical.
As armas são elementos simbólicos e mecânicos centrais. O jogador começa com o Arch, uma lâmina de luz que combina ataques rápidos e acrobáticos. Depois, adquire o Gale, que lança projéteis energéticos, e o Veil, um escudo pesado que oferece força e defesa. Cada arma representa uma filosofia de combate e uma forma de equilíbrio espiritual. A escolha de qual usar reflete o estilo do jogador e sua relação com o ritmo da batalha.

Um detalhe fascinante é o sistema de purificação das armas. À medida que Enoch luta contra inimigos corrompidos, suas armas também se contaminam com impurezas. Para mantê-las eficazes, o jogador precisa purificá-las, num gesto simbólico que reforça o tema da pureza espiritual. É um detalhe simples, mas repleto de significado, que transforma o combate em um ritual de redenção.
A dificuldade de El Shaddai é cuidadosamente ajustada. O jogo recompensa precisão e paciência, mas raramente pune de maneira injusta. Cada derrota serve como parte do aprendizado, e até o sistema de “vida” é tratado de forma simbólica. Quando Enoch está prestes a morrer, o jogador pode apertar botões rapidamente para fazê-lo se levantar — uma representação literal da persistência da fé e da vontade divina.
Além do combate, há longas seções de plataforma, muitas delas em perspectiva 2D. Esses momentos são construídos com elegância artística, misturando sombras, luzes e silhuetas para criar composições de rara beleza. A alternância entre 3D e 2D não é apenas técnica, mas simbólica: o jogo muda de perspectiva para refletir a dualidade entre corpo e espírito, entre liberdade e controle.
A trilha sonora é outro elemento transcendental da experiência. Composta por Masato Kouda, a música de El Shaddai combina corais celestiais, harpas etéreas e batidas eletrônicas sutis, criando um som ao mesmo tempo divino e melancólico. Cada faixa é cuidadosamente posicionada para intensificar a emoção das cenas, tornando a jornada espiritual de Enoch quase litúrgica. A música não apenas acompanha o jogo, mas o eleva — como se o som fosse parte da própria narrativa.

O design dos personagens é memorável. Enoch é retratado como um guerreiro angelical vestido com uma armadura de luz que se fragmenta à medida que ele recebe dano, simbolizando sua vulnerabilidade humana diante da missão divina. Lucifel, por outro lado, é moderno e enigmático, contrastando com os anjos caídos, que assumem formas extravagantes, ora belas, ora monstruosas. Essa estética estilizada reforça o tom alegórico do jogo, onde cada figura é um arquétipo, não apenas um personagem.
O ritmo da narrativa é contemplativo. Ao contrário de muitos jogos de ação, El Shaddai não apressa o jogador; ele o convida a observar, a interpretar, a sentir. Há momentos longos de silêncio, onde a música e o ambiente falam mais do que as palavras. Essa cadência meditativa é parte essencial da experiência, lembrando que o jogo não busca apenas entreter, mas provocar reflexão.
Do ponto de vista técnico, o jogo foi um feito notável. O uso da engine gráfica própria da Ignition permitiu efeitos de luz e sombra impressionantes para a época. A iluminação é tratada quase como um personagem — ela guia o olhar, define o tom emocional e simboliza a presença divina. Mesmo hoje, El Shaddai continua visualmente deslumbrante, resistindo ao tempo como uma verdadeira obra de arte interativa.
A recepção crítica foi diversa. Alguns elogiaram o jogo como uma experiência espiritual e estética inigualável, enquanto outros criticaram sua linearidade e simplicidade mecânica. No entanto, com o passar dos anos, El Shaddai ganhou o status de cult, admirado por seu estilo inconfundível e coragem criativa. É lembrado como um exemplo de quando o videogame se transforma em arte pura, desafiando convenções narrativas e visuais.

A influência de El Shaddai pode ser percebida em diversas obras posteriores, especialmente em jogos que buscam unir espiritualidade, filosofia e estética artística. Seu impacto é silencioso, mas profundo, ecoando na memória de jogadores que experimentaram sua beleza etérea. Em 2021, o jogo recebeu uma versão remasterizada para PC, reacendendo o interesse e apresentando sua mensagem a uma nova geração.
Mais do que uma aventura de ação, El Shaddai: Ascension of the Metatron é uma reflexão sobre fé e imperfeição. Ele mostra que até os seres escolhidos podem duvidar, e que a pureza espiritual não vem da obediência cega, mas do entendimento. Cada torre escalada, cada anjo derrotado e cada purificação de arma são metáforas de uma luta interior — a eterna batalha entre o divino e o humano que habita dentro de cada um de nós.
No fim das contas, El Shaddai é uma experiência única, uma prece em forma de jogo. Sua beleza visual, sua musicalidade celestial e sua narrativa simbólica o tornam uma obra atemporal, um lembrete de que os videogames também podem ser poesia. É uma jornada de luz, fé e arte — e, acima de tudo, um convite para olhar além das aparências e enxergar o divino escondido nas formas mais humanas de criação.
Titulo do jogo: El Shaddai Ascension of the Metatron
Idioma: INGLÊS
Gênero: AÇÃO
Tamanho: 7.4 GB
Plataforma: Playstation 3
Formato: PKG

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