Bully coloca o jogador no papel de Jimmy Hopkins, um adolescente rebelde, inteligente e sarcástico que é deixado por sua mãe em um internato chamado Bullworth Academy. Desde o início, o jogo estabelece um clima de ironia e humor ácido, típico das produções da Rockstar, ao retratar a escola como um microcosmo da sociedade moderna. Em vez de criminosos ou gangues urbanas, o jogador lida com valentões, professores autoritários, alunos ricos e toda sorte de figuras caricatas que representam diferentes grupos sociais.

Bullworth Academy é o cenário central e o coração pulsante da experiência. A escola é um espaço vivo, cheio de regras, horários e hierarquias. Há aulas a cumprir, horários para dormir e uma série de atividades extracurriculares, mas também liberdade para explorar, causar confusão e desafiar a autoridade. O ambiente mistura realismo e exagero, funcionando como uma sátira ao sistema educacional e à própria adolescência.

A trama acompanha a trajetória de Jimmy tentando sobreviver em um ambiente hostil e cheio de intrigas. Rapidamente, ele se vê envolvido em disputas entre diferentes facções estudantis — os Nerds, os Preppies, os Greasers, os Jocks e os Bullies. Cada grupo domina uma parte da escola e tem sua própria cultura, estilo e códigos de conduta. A missão de Jimmy é unificar essas gangues e trazer uma espécie de equilíbrio ao caos escolar, mesmo que seus métodos sejam um tanto questionáveis.

A narrativa de Bully é estruturada em capítulos que representam diferentes períodos do ano letivo. Cada parte introduz novas áreas da cidade, missões e desafios, mantendo o ritmo constante e variado. Entre aulas, brigas e travessuras, o jogador acompanha uma história cheia de humor, crítica social e momentos de reflexão sobre poder, amizade e identidade. Apesar da atmosfera cômica, há momentos de empatia genuína, que revelam o lado humano por trás das máscaras dos personagens.

O protagonista Jimmy Hopkins é um anti-herói clássico da Rockstar, mas adaptado à realidade adolescente. Ele é rebelde, mas tem um forte senso de justiça; é sarcástico, mas também compassivo; é brigão, mas não cruel. Essa dualidade o torna um personagem complexo e carismático, capaz de conquistar o respeito do jogador e dos demais alunos. Ao longo da jornada, Jimmy amadurece, aprendendo a lidar com a autoridade, a violência e a hipocrisia das instituições.

A jogabilidade de Bully é uma das mais criativas da geração do PlayStation 2. Inspirada na estrutura de Grand Theft Auto, ela oferece um mundo semiaberto, com liberdade para explorar a escola e a cidade ao redor. O jogador pode participar de aulas, como Química, Inglês, Arte e Educação Física, cada uma com minigames próprios e recompensas úteis, como novos equipamentos ou habilidades. Essa rotina escolar dá ritmo e autenticidade à experiência, fazendo com que o jogador se sinta realmente parte daquele ambiente.

As aulas são um destaque à parte. Na de Química, por exemplo, é possível criar bombas de fedor, fogos de artifício e outras armas caseiras. Na de Inglês, o jogador forma palavras em um jogo de letras, melhorando a habilidade de pedir desculpas ou escapar de encrencas. Já a de Educação Física ensina novos golpes, enquanto Arte permite conquistar vantagens sociais, como beijos mais duradouros dos interesses amorosos de Jimmy. Esses detalhes mostram como Bully transforma o cotidiano em algo lúdico e recompensador.

O sistema de combate é simples, mas eficaz. Jimmy pode socar, chutar, empurrar e usar uma variedade de armas improvisadas, como estilingues, bombas fedorentas, bolinhas de gude e até uma bicicleta para atropelar rivais. Cada luta exige estratégia, já que os inimigos variam em força e estilo. Além das brigas, o jogo introduz um sistema de furtividade, permitindo que Jimmy se esconda em armários, se disfarce e realize travessuras sem ser pego pelos inspetores.

A cidade de Bullworth é um dos elementos mais impressionantes do jogo. Ela é dividida em diferentes distritos, cada um com sua estética e personalidade — desde os subúrbios simples até o centro urbano e as fazendas nos arredores. A medida que o jogador avança, novas áreas são desbloqueadas, revelando lojas, pistas de corrida, casas abandonadas e até uma feira com minigames. Essa expansão progressiva reforça a sensação de crescimento pessoal e liberdade.

O humor de Bully é um de seus maiores trunfos. A Rockstar utiliza a sátira para criticar a hipocrisia das instituições educacionais, a rigidez das regras sociais e o moralismo dos adultos. Professores corruptos, diretores incompetentes e alunos mimados compõem um retrato irônico, mas realista, das contradições da sociedade. Apesar das polêmicas que cercaram o lançamento, o jogo nunca glorifica a violência — ele a utiliza como ferramenta narrativa para expor o absurdo do autoritarismo e da repressão.

A trilha sonora composta por Shawn Lee é uma das mais icônicas da época. Ela combina elementos de funk, rock e música experimental, criando uma atmosfera única que alterna entre o cômico e o melancólico. Cada área da escola e da cidade tem temas próprios, que refletem o humor e o ritmo das situações. O som dos passos nos corredores, o toque do sinal e as vozes dos alunos dão vida a um ambiente que parece sempre ativo e cheio de histórias.

Os personagens secundários são um espetáculo à parte. Cada estudante e professor tem uma personalidade distinta, com diálogos engraçados e reações únicas. Há o nerd tímido, o atleta arrogante, a garota popular e o valentão sem cérebro, todos representados de forma caricata, mas também humana. Essas figuras constroem um ecossistema social dinâmico, no qual cada decisão de Jimmy afeta sua reputação e suas relações com os outros.

As interações sociais são um dos pilares da jogabilidade. Jimmy pode fazer amizades, conquistar romances, provocar brigas e até subornar pessoas para evitar problemas. O sistema de reputação influencia diretamente como os personagens reagem a ele, criando uma sensação de consequência e realismo. Essa dimensão social faz de Bully um simulador de vida adolescente tão completo quanto divertido.

Visualmente, o jogo impressionava para seu tempo. O estilo gráfico da Rockstar equilibra realismo e caricatura, resultando em personagens expressivos e ambientes detalhados. As cores vibrantes e o design variado dos locais reforçam o clima de uma cidade pequena e cheia de vida. Mesmo anos depois, a estética de Bully continua encantadora, principalmente nas versões remasterizadas lançadas para PC e consoles posteriores.

O ritmo narrativo é muito bem construído, alternando momentos de humor leve com situações mais sérias. Ao longo da história, Jimmy não apenas enfrenta bullies, mas também descobre conspirações, traições e injustiças que envolvem toda a estrutura da escola. A sensação de progresso é constante, tanto em termos de narrativa quanto de mecânicas, mantendo o jogador engajado do início ao fim.

O jogo também explora o tema da autoridade e da hipocrisia adulta com uma ironia afiada. Em Bullworth, os professores pregam disciplina, mas agem com favoritismo e desonestidade; os alunos mais ricos cometem atrocidades sem punição, enquanto os mais pobres são constantemente punidos. Jimmy, em sua rebeldia, acaba sendo o único que realmente tenta trazer justiça — mesmo que de formas pouco ortodoxas. Essa crítica social sutil é um dos grandes méritos do jogo.

Além da história principal, Bully oferece uma série de atividades paralelas que enriquecem a experiência. Corridas de bicicleta, competições de boxe, missões de entrega e pequenos trabalhos rendem dinheiro e itens especiais. A liberdade para explorar e se envolver com diferentes aspectos da cidade faz com que cada sessão de jogo seja única, cheia de descobertas e situações imprevisíveis.

Apesar das polêmicas e tentativas de censura que enfrentou, Bully se firmou como uma das obras mais inteligentes e bem escritas da Rockstar. O jogo não promove violência gratuita, mas sim uma reflexão sobre a adolescência, o poder e a necessidade de resistir às injustiças. Sua coragem em abordar temas delicados com humor e sensibilidade o transformou em um clássico cult, lembrado com carinho por fãs até hoje.

Com o passar dos anos, Bully ganhou versões atualizadas e o título Bully: Scholarship Edition, que trouxe melhorias gráficas e novas missões. Mesmo sem uma sequência oficial, o desejo por Bully 2 permanece vivo entre os jogadores, evidenciando o impacto duradouro da obra. O jogo marcou uma geração ao provar que até os muros de uma escola podem abrigar histórias grandiosas e profundas.

No fim, Bully é mais do que uma sátira da vida estudantil — é uma jornada de amadurecimento, resistência e autoconhecimento. Ele mostra que o verdadeiro herói pode surgir nos lugares mais improváveis e que enfrentar a injustiça, mesmo em pequena escala, é um ato de coragem. Jimmy Hopkins, com sua rebeldia e senso de justiça, se tornou um ícone, e Bully permanece como uma das experiências mais originais e inesquecíveis da história dos videogames.